segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Quase em Porto Alegre

A distribuição estava completa. Os exemplares de Crepúsculo, O Senhor dos Anéis, de livros do Paulo Coelho e da Agatha Christie, os CDs, os blu-rays; o que fora pedido fora comprado, o que fora comprado fora entregue. Nenhuma solicitação deixou de ser atendida – nem sempre isso acontecia, afinal o processo envolvia uma longa cadeia, mas neste fim de ano, todas as lojas tinham tudo que afirmaram necessitar. A esta altura, a maior parte do que seria vendido já o fora, afinal hoje é segunda-feira e a terça trará consigo a véspera de Natal.

Tendo deixado para trás mais um período de desafio, Carlos Alberto finalmente voltou sua total atenção para as reuniões que teria em Porto Alegre. Passaria a noite de Natal com a família de Maria Clara; visitariam os pais dele no dia 25. Na manhã seguinte, partiria para a capital gaúcha. Visitaria a loja já existente da rede, tendo conseguido marcar um breve encontro com o gerente de lá – o da nova loja ainda não havia sido contratado. No caso de contar com algum tempo livre, cogitou visitar livrarias da concorrência. Ainda não decidira o que fazer à noite. Não queria ficar trancado no hotel, disso tinha certeza. Pensou que poderia pedir uma dica ao arquiteto Caio.

Imaginaria Caio tratar-se de uma insinuação? E em caso afirmativo, como reagiria? Carlos Alberto enxergava o homem com quem em breve se encontraria como alguém solitário. Seria ele avesso a proximidade; ou teria sido deixado de lado por um mundo do qual desejava fazer parte, mas que não parecia disposto a convidá-lo a aproximar-se? Qualquer que fosse o caso (e poderia ser ainda que Carlos estivesse plenamente equivocado em suas suposições), desenvolvera certa simpatia pelo antigo paulista, agora gaúcho adotado. Pegava-se imaginando que ideias o arquiteto teria para a nova loja. Visualizava disposições surreais, estantes formando desenhos geométricos ousados, cores loucas, vivas. Lembrou-se que nada disso seria realmente possível; particularmente as cores seriam padronizadas.

Quanto senso prático teria Caio? Seu trabalho seria ser prático, afinal fora encarregado de falar com o arquiteto em grande parte por sua experiência como gerente de loja. Enquanto os clientes andam de um lado para o outro, e os títulos populares ficam orgulhosamente expostos, e os funcionários são treinados para manter o sorriso no rosto, alguém precisa repor o estoque. A área da fila para os caixas precisa ser confortável sem tomar muito espaço ou bloquear o acesso a partes do estabelecimento. A entrada da área restrita a trabalhadores precisa estar sutilmente inserida, quase camuflada, mas ainda assim de fácil acesso quando necessário. Os terminais de consulta precisam estar dispostos de forma a facilitar o atendimento, tornando o tempo de espera do cliente o mais curto possível (e liberando o atendente para servir ao próximo freguês o quanto antes). Esperava que Caio não fosse o tipo de arquiteto que toma considerações de ordem prática como aborrecimentos.

Decidiu que não havia porque ser dúbio: escreveria para Caio dizendo que gostaria que saíssem juntos na noite do dia 26. Caso já estivesse comprometido, poderia então fazer alguma sugestão de um lugar a visitar? Abriu o e-mail e começou a compor a mensagem.

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